quinta-feira, 12 de março de 2009

Os frangos da angústia

No mesmo dia em que fui companheiro de viagem do Avelino, com o episódio da lâmpada que se acendeu no painel de controlo da viatura, havia de registar-se uma nova aventura.
Decorria a nossa viagem em velocidade talvez excessiva, quando a certa altura ultrapassamos um automóvel ligeiro, já sobre uma curva da estrada.
Teria sido uma manobra algo perigosa.
Sempre em andamento bastante acelerado, a dado momento deparamo-nos com o nosso pronto-socorro e uma equipa, comandada pelo Ferreira, que se preparava para socorrer um camião que se havia despistado.
Paramos à frente do pronto-socorro e saímos para ver o aparato causado pelo despiste do camião, que transportava grades de verga com cabritos, galináceos, porcos, etc.
Passados uns momentos, chega e pára junto a nós, o automóvel que havíamos ultrapassado.
O seu condutor identifica-se como oficial superior e pergunta quem era o responsável da nossa viatura.
Percebendo que algo de anormal estava a passar-se, tive ainda tempo de fazer sinal ao Ferreira, para que dissesse que a viatura estava ali integrada naquela equipa de socorro, e assim foi.
O mesmo oficial pergunta então se não tinha passado ali uma viatura igual àquela, ao que o Ferreira disse que sim, e que havia prosseguido viagem.
Muito furioso, disse que tinha presenciado uma manobra muito arriscada e o militar que a cometeu tinha de ser punido.
E arrancou, dizendo que tinha de o alcançar nos Morros de Salazar.
Não alcançou, porque nós o ludibriámos, e ficamos então na caçada aos frangos, porcos e cabritos que se tinham tresmalhado com o despiste, recolhendo uma quantidade enorme de animais para as nossas comezainas.
No dia seguinte, vamos então mandar preparar um petisco de frangos, servido no reservado de um café-restaurante por nós frequentado.
Já bem comidos e bebidos, a certa altura cria-se uma confusão entre o Ferreira e uma funcionária que descia pelas escadas de serviço do primeiro andar do prédio, separadas do reservado por uma grade de madeira.
Sentindo que estava a ser provocada, ameaça o Ferreira com uma vassoura.
Este reage, saltando a grade e correndo atrás dela pelas escadas.
Surge então o patrão que, assumindo a defesa da empregada, tenta agredir o Ferreira com a mesma vassoura.
Este, mais lesto, segura-o e dá-lhe um encontrão que o faz tombar.
Lá conseguimos serenar os ânimos, mas passado pouco tempo surge uma patrulha militar a intimar-nos para irmos ao quartel, pois haviam feito queixa do Ferreira.
A partir daí desenrola-se contra ele um processo disciplinar, cuja instrução nunca terminou, porque o Chefe Carvalho também nunca lhe deu sequência, apesar dos inúmeros pedidos da Repartição de Justiça do Batalhão, que tinha a instrução a seu cargo.
Já perto do final da comissão o Chefe Carvalho chama o Ferreira, dá-lhe para as mãos as folhas do processo, até ali manuscritas, e diz-lhe para as rasgar.
Ainda assim, a angústia do Ferreira não terminou, pois receava que houvesse qualquer pendência nos serviços de justiça, que o impedissem de regressar à Metrópole.
Serenou de vez quando, já em Luanda, foi informado que o Serviço de Justiça nos havia passado a quitação respeitante ao PAD 1245.
Mas antes levou um susto, quando lhe disse que o seu caso não estava encerrado, tendo de ficar até à sua conclusão.

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